2010/03/28

27 - Geladeira - NÃO


Estes dias me deparei com um texto atribuído a Frei Beto. O texto conta que Carlinhos Brown passou a infância sem geladeira. E sem fome. Foi com a chegada do eletrodoméstico que eles descobriram a comida desnecessária e a fome. Fiquei pensando no assunto e decidi que seria interessante se daqui a cem anos não tivéssemos geladeira em casa.

Há muito tempo, conheci uma figura dessas que a gente acha que só existem nos livros ou nas histórias de matutos não muito confiáveis. Era o véio do mato, um homem velho (ou aparentemente velho), que vivia com sua longa barba branca (bem amarelada) em uma cabana no meio do mato. Entre as várias pérolas de sabedoria que ele compartilhou conosco, estava sua ojeriza à geladeira. Não tanto ao objeto em si, mas ao fato de comermos carne de bichos mortos há dias: "e essa carne podre fica na barriga fazendo gulugulugulu...".

Não deixa de ter sua razão. Sei que a temperatura baixa desacelera o processo de putrefação da carne, mas, ela continua se degradando, só mais lentamente... Basta esquecer de fazer a carne no dia certo pra ver como ela fica uns dias depois.

Eu, particularmente, não tenho nehum dilema ético quanto ao consumo de carne animal. O que me incomoda nessa história toda, é a forma com que os bichos são criados. Eles vêm ao mundo não para serem eles, mas sim, para serem nossa comida. Reproduzem, engoradam e são mortos só para nos alimentar.



Não sei se dá pra fazer um paralelo com a vida humana, mas eu penso que não seria um modo tão ruim de morrer, estar passeando pelo mato e ser pego por uma onça. Faz parte... Se não for ela, serão os vermes. O chato seria ser criado num espaço limitado, sendo alimentado por uma ração engordante especialmente preparada pelas onças e ser morta em um matadouro pra ir pruma prateleira de supermercado das onças... Eita vidinha besta, sô!

A mesma coisa para os bichos, ser comido por gente é um dos finais possíveis. Morrer para ser comido é ocupar sua parte na cadeia alimentar. O chato é viver como comida. Viver sem naturalidade e morrer com crueldade.

Nossa sociedade é muito louca. Fazemos as barbaridades, mas deixamos tudo que possa nos impactar emocionalmente bem longe de nós. A geladeira é a porta do matadouro que dá direto na nossa cozinha. Se temos problemas com o desmatamento e a criação extensiva de gado, a geladeira faz parte disso.


O ideal seria fazer como nossos avós, que pegavam a galinha no quintal, matavam, depenavam e cozinhavam na hora. Um dia ainda quero fazer isso, matar uma galinha e ver se tenho coragem de comer o bicho.


De fato, viver sem geladeira nos obrigaria a repensar nosso consumo de alimentos. É por essa e por outras que quero que daqui a cem anos não tenhamos geladeira em casa. Quero que a produção de alimentos seja descentralizada e que possamos ter frutas, legumes, hortaliças e carne fresca produzidos bem pertinho de nós, tendo consciência plena de tudo aquilo que colocamos para dentro de nossa barriga.

3 comentários:

  1. ...E sabe que no meu caso, deixar ou não de comer carne, passou a ser um dilema assim que presenciei a morte de umas aves (umas galinhazinhas) no quintal de casa, quanto eu morava em Curitiba (entre outros lugares, morei na capital do Paraná, mas por um curto período). Assisti àquele tenebroso ‘zoocídio’ (sei lá se poderia apelar para um neologismo desse, mas agora já foi) praticado pelo irmão de uma empregada que nós tivemos. Para mim, ver o assassinato das galinhas foi chocante! (Como essa palavra, chocante, caiu bem; acho que tem tudo a ver com galináceos.). Tornei-me vegetariano a partir de então. E isso já passados quarenta anos... Agora quanto à geladeira... Eu iria sentir falta dela, sim.
    Fulano de Beltrano (Ou SF; ou Substrato do Pó do Nada; ou Restolho do Rebostalho... Ou Celso.)
    Continue postando (outra hora verei as postagens antigas)
    Tudo de bom pra você. Volto depois.

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  2. obrigada pelo texto..obriagada por compartilhar

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